No artigo de hoje vamos dar continuidade ao nosso estudo sobre Long & Short (L&S) por cointegração.
Recapitulando, aprendemos no primeiro artigo dessa série o conceito de séries estacionárias e não-estacionárias, e vimos que devemos procurar por estacionaridade no resíduo entre um par de ativos que estamos interessados. Vimos também que esse resíduo é calculado por meio de uma regressão linear e que o teste de Dickey-Fuller é o mais usado para descobrir se o resíudo é realmente estacionário em um determinado intervalo de tempo.
Já no segundo artigo da série, estudamos a importância na escolha da janela de tempo que utilizamos quando calculamos o modelo linear. Vimos que, embora existam diversas abordagens, um período de 250 dias é uma escolha comum.
Nesse terceiro artigo da série vamos aprender como efetivamente aplicar essa estratégia na prática.
Para isso, vamos ter que separar os nosso dados em duas fases:
A primeira parte, chamada de fase de treino, será utilizada para calcular se o resíduo é estacionário e se o par está cointegrado para diferentes janelas de tempo. Aqui, vamos obter o modelo linear que vamos utilizar na fase seguinte.
A segunda fase será utilizada para testar se o modelo linear encontrado possui retornos à média a partir de um específico ponto de entrada. Em outras palavras, é o backtest da cointegração.
Com isso, vamos aprender a identificar esses sinais de entrada, assim como definir o nosso alvo e stop.
Ansioso?! Então mãos-à-obra e vamos nessa!
Importando as bibliotecas
Vamos começar importando as bibliotecas que vamos usar no nosso estudo.
import pandas as pd
import matplotlib.pyplot as plt
from sklearn.linear_model import LinearRegression
from statsmodels.tsa.stattools import adfuller
Definindo nossos ativos
O primeiro passo para começar a análise é definir os dois ativos que queremos estudar. Nos artigos anteriores vinhamos analisando o par PETR3 e PETR4. Contudo, como esse par é muito batido, fica difícil aplicar a estratégia pois ele é constantemente arbitrado.
Portanto, para o estudo de hoje, vamos escolher um ativo de varejo, Lojas Renner (LREN3), e uma construtora, JHSF (JHSF3) como nosso par para análise. Provavelmente esse não é o típico par que você esperaria ver, certo?! Porém, essa é uma das grandes belezas da cointegração: encontrar verdades matemáticas "escondidas" no mercado financeiro.
Será que esse par vai estar cointegrado?
Os arquivos csv utilizados aqui estarão disponíveis no nosso grupo do Telegram. Note que estamos utilizando a opção parse_dates para converter o nosso index do tipo string para o tipo datetime.
Para juntar os dados no mesmo dataframe, usamos a função pd.merge do Pandas e escolhemos a coluna datetime como elemento comum entre eles.
Lembre-se que a ordem dos ativos importa no estudo de cointegração. Na nossa análise, JHSF3 será o ativo base (Base Asset) e LREN3 o ativo de comparação (Comparison Asset). Curioso para saber como seriam os resultados trocando a ordem? Tente rodar no seu computador como dever de casa!
Para dar sequência ao nosso estudo vamos separar os nosso dados em duas partes: treino e teste.
A parte de treino será usada para calcular a estacionariedade do resíduo para diversos intervalos de tempo. Se a maioria deles for estacionário, vamos aceitar a cointegração do par e escolher um intervalo para calcular o modelo linear (normalmente 250 dias).
Com isso, podemos prosseguir para a fase de teste, onde vamos utlizar esse modelo para procurar por possíveis trades.
Nessa análise, vamos separar os dados de treino por um período de 250 dias e testar para os próximos 130 dias.
Ao final dos 130 dias, podemos reavaliamos os últimos 250 dias pra verificar se a cointegração ainda existe. Se sim, nós mantemos a estratégia. Se não, paramos e vamos em busca de um novo par.
Exemplificando:
Dia 1 ao 250: avaliar se o par está cointegrado.
Caso esteja cointegrado, aplicar a estratégia do dia 251 ao dia 380.
No dia 381, testar a cointegração no período 131 a 380.
Caso esteja cointegrado, continuar aplicando a estratégia do dia 381 ao 510.
Assim em diante...
Parece complicado? Calma que vamos entender melhor com o exemplo a seguir.
O primeiro passo é separar os nossos dados em treino e teste pelo período de tempo que determinamos.
time_train = 250
stocks_train = stocks.iloc[:time_train].copy()
print(f"Tamanho da base de treino: {len(stocks_train)}")
time_test = 130
stocks_test = stocks.iloc[time_train:time_train + time_test].copy()
print(f"Tamanho da base de teste: {len(stocks_test)}")
Tamanho da base de treino: 250 Tamanho da base de teste: 130
Fase de treino
Essa primeira fase pode ser dividida em 3 passos, que são os passos que aprendemos nos artigos anteriores. Eles são:
Definir quantas janelas de tempo devem possuir o resíduo estacionário para aceitarmos a cointegração.
Treinar um modelo linear com os dados do par escolhido para análise.
Verificar se o resíduo é estacionário com pelo menos 95% de confiabilidade para os intervalos escolhidos.
Para isso, vamos combinar as funções que programamos nos últimos dois artigos. Aqui, apenas uma pequena mudança é feita: retornaremos também o valor do coeficiente angular, β, quando calculamos o resíduo pela regressão linear.
def calculate_residual(df, time_period):
df = df.iloc[-time_period:].copy()
# values converted into a numpy array
# '-1' to calculate the dimension of rows, and '1' to have only 1 column
X_independent = df.iloc[:,1].values.reshape(-1, 1)
Y_dependent = df.iloc[:,0].values.reshape(-1, 1)
# performing the linear regression
reg = LinearRegression().fit(X_independent, Y_dependent)
# get the angular coef.
beta = reg.coef_[0][0]
# get the predicted Y given X from the model
Y_predict = reg.predict(X_independent)
# attaching the residual (Y_dependent-Y_predict) from a numpy array to a pandas series
df['Residual'] = Y_dependent - Y_predict
return df, beta
def check_stationary(df, time_periods, min_confidence=95):
# initialising an empty list that will receive the output
stationary_intervals = []
# loop over the list for all time periods
for t in time_periods:
# call the function to calculate the residuals
residual, beta = calculate_residual(df, t)
# performing the Augmented Dickey-Fuller test in the residual
residual_test = adfuller(residual['Residual'])
# calculating the condidence in percentage from the p-value (index 1 of the output test)
confidence = 100 * (1 - residual_test[1])
# testing for stationarity given a threshold
if confidence >= min_confidence:
stationary_intervals.append(True)
else:
stationary_intervals.append(False)
# return the interval and if it is stationary
return stationary_intervals
Com isso podemos facilmente calcular se o resíduo do par escolhido na fase de treino é estacionário.
Para fortalecer ainda mais a nossa análise, vamos definir 8 intervalos de tempo em no máximo 250 dias e aceitar a cointegração apenas se o resíduo for estacionário para pelo menos 5 desses intervalos (mais da metade).
Lembre-se que a variável time_periods é uma lista de intervalos.
time_periods = [120, 140, 160, 180, 200, 220, 240, 250]
min_confidence = 95
is_stationary = check_stationary(stocks_train, time_periods, min_confidence)
for time, stationary in zip(time_periods, is_stationary):
print(time, stationary)
Ótimas notícias, o nosso par possui resíduo estacionário com 95% de confiabilidade em 7 dos 8 intervalos que escolhemos! Isso significa que o resíduo desse par pode ser considerado estacionário segundo os nossos critérios.
Podemos também plotar o resíduo para visualizar essa estacionariedade. Para isso, precisamos primeiramente chamar a função calculate_residual com o intervalo de tempo que queremos observar.
Agora podemos plotar o resíduo juntamente com a média para esse intervalo.
mean = df['Residual'].mean()
plt.title("Residual for t = 250")
df['Residual'].plot(x="Major", y="", figsize=(14,6))
plt.axhline(y=mean, color='y', linestyle='-')
plt.show()
Embora o resíduo não pareça estacionário nos primeiros meses de análise, de fato ele claramente oscila em torno da média (eixo y = 0 no gráfico) após esse período inicial.
Antes de darmos início à nossa fase de teste, precisamos definir nosso critério de entrada, saída e stop.
Pontos de entrada, alvo e stop
O conceito da estratégia de Long & Short por cointegração é o retorno à média no resíduo de um par cointegrado. Portanto, o que se faz é definir uma determinada distância da média considerada uma discrepância para um resíduo estacionário. Ou seja, o resíduo já se afastou muito da média, e como ele é estacionário, ele tenderia a voltar para média.
Usualmente se define o ponto de entrada quando o resíduo de um par estacionário estiver em uma distância de dois desvios padrão para cima ou para baixo da média.
E qual será o alvo? Ora, uma vez que a estratégia é baseada em retorno a média, o será quando o resíduo do par voltar para média (i.e. desvio padrão = 0).
E o nosso stop? Aqui também não existe uma resposta específica, mas já que estamos buscando um retorno de dois desvios padrão (entrada em 2 e saída em 0), podemos definir o stop como sendo a três desvios padrões da média. Em outras palavras, arriscamos 1 desvio padrão para ganharmos 2.
Z-Score
Já que estamos definindo a distância da média em função do desvio padrão, faz sentido analisarmos o resíduo em função do desvio padrão. Para isso, podemos utilizar o Z-Score.
O Z-Score é uma medida estatística que descreve a relação de um determinado valor com a média de um conjunto de valores. No nosso caso, ele pode ser ser calculado subtraindo da média do conjunto de pontos, o valor do resíduo em um determinado ponto, tudo isso normalizado pelo desvio padrão do conjunto. Matematicamente:
Z-Score(i)=σ(residual)residual(i)−med(residual)
Onde med é a média e σ é o desvio padrão.
Podemos facilmente calcular o Z-Score utilizando pandas.
Como vamos plotar os resultados do Z-Score novamente durante o período de teste, criarmos uma função para plotar o Z-Score junto com os pontos de entrada (σ=2) e stop (σ=3) que definimos anteriormente.
Note que qualitativamente o Z-Score se comporta igual ao resíduo. Porém repare que, agora, o eixo y possui valores relativos ao desvio padrão, o que facilita a nossa análise.
É importante ressaltar que nenhuma conclusão da estratégia pode ser tirada nesse ponto, uma vez que esse é apenas o conjunto de treino.
Proporção de compra e venda
A proporção de compra e venda vai depender do coeficiente angular (o nosso β) que obtemos treinando o nosso modelo linear. Nesse caso:
print('beta =', round(beta, 3))
beta = 0.205
O beta é de aproximadamente 0.20. Ou seja, para cada 1 ação do ativo base, nós vamos operar com 0.2 ações do ativo de comparação. Trazendo isso para a realidade dos lotes da bolsa, para cada 500 ações do ativo base, nós vamos operar 100 ações do ativo de comparação.
E qual ativo comprar e qual ativo vender?
Isso vai depender do valor do Z-Score. Como definimos 2 desvios padrão como sendo o nosso ponto de entrada, se o Z-Score for ≥ 2 nós vamos vender o ativo base e comprar o ativo de comparação.
Por outro lado, se o Z-Score for ≤ -2, nós vamos comprar o ativo base e vender o ativo de comparação. Sempre respeitando a proporção definida pelo beta.
Fase de teste
Agora que ja treinamos o modelo, definimos os pontos de entrada e saída, e aprendemos qual e quanto comprar ou vender de um determinado ativo, podemos dar início a fase de teste.
Ela será dividida nos seguintes passos:
Definir o dataframe com os dados de teste.
Calcular o novo resíduo, que será obtido como a diferença entre a variável depentente e o nosso modelo linear treinado anteriormente.
Calcular e plotar o Z-Score para análise de possíveis trades.
# define df as the dataframe holding the test data
df = stocks_test
# calculate the residual using the model obtained from the training set
df['Residual'] = df.iloc[:,0] - beta * df.iloc[:,1]
# calculate Z-score
df['Z-Score'] = (df['Residual'] - df['Residual'].mean()) / df['Residual'].std()
df
Base Asset
Comparison Asset
Residual
Z-Score
datetime
2021-05-12
6.78
39.07
-1.244978
-1.090657
2021-05-13
6.90
39.92
-1.299568
-1.258184
2021-05-14
6.97
39.58
-1.159732
-0.829052
2021-05-17
7.30
40.80
-1.080320
-0.585351
2021-05-18
7.32
40.44
-0.986376
-0.297053
...
...
...
...
...
2021-11-10
5.57
32.76
-1.158904
-0.826511
2021-11-11
5.65
33.93
-1.319222
-1.318499
2021-11-12
5.48
32.23
-1.140042
-0.768627
2021-11-16
5.18
31.21
-1.230534
-1.046331
2021-11-17
5.05
30.86
-1.288644
-1.224661
130 rows × 4 columns
Agora podemos chamar a função que criamos para plotar o Z-Score e analisar o resultado.
plot_residual(df, time_test)
Como podemos ver no gráfico acima, nesse período de 130 dias a estratégia deu sinal de entrada três vezes.
Calcular cada um dos retornos para esse período deixaria esse post muito longo. Por isso, vamos deixar o cálculo exato do backtest para um próximo artigo.
Porém, podemos fazer uma análise mais qualitativa. Os dois primeiros trades aconteceraam na parte inferior do gráfico, onde o Z-Score estava menor que -2 (linha horizontal azul no gráfico).
Por isso, para esses dois primeiros trades seguiríamos a seguinte estratégia:
Compra de 500 unidades do ativo base (JHSF3) e venda de 100 unidades do ativo de comparação (LREN3).
Nesse caso, os dois trades teriam sido positivos, pois o Z-Score retornou a média.
Para o terceiro trade, o Z-Score chegou na ponta oposta do gráfico, em 2 desvios padrão positivo. Portanto, agora a estratégia muda de ordem. Nós iríamos:
Vender 500 unidades do ativo base (JHSF3) e comprar 100 unidades do ativo de comparação (LREN3).
Nesse caso, podemos ver no gráfico que o Z-Score também voltou à média e o trade teria sido positivo.
Conclusão e próximos passos
No artigo de hoje, demos sequência ao nosso estudo de cointegração onde aprendemos a criar um modelo linear, com base nos dados de treino, para podermos testar a nossa estratégia.
Definimos um intervalo de tempo com 8 janelas e aceitamos a cointegração do par se mais da metade dessas janelas possuíssem o resíduo estacionário. Além disso, escolhemos um período de 250 dias para ajustar o coeficiente do nosso modelo linear.
Aprendemos também a definir um ponto de entrada e stop com base no Z-Score.
Após, aplicamos o nosso modelo linear nos dados de teste, onde achamos três pontos de entrada. Todos eles teriam tido um retorno positivo, visto que o Z-Score retornou a média.
No próximo artigo da série, vamos aprender a calcular um stop no tempo, com base na meia-vida do resíduo. Além disso, vamos calcular os retorno propriamente e realizar o backtest dessa estratégia!
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